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Recentes Julgados do STJ - Planos de Saúde. Reajuste por Faixa Etária - 3ª Idade.
Luciana de Abreu Miranda
12/1/2015

No último Informativo disponibilizado pelo STJ em 03.12.2014 (Informativo nº 551) foram noticiadas duas relevantes decisões concernentes aos direitos dos segurados de planos de saúde.

A primeira decisão foi proferida pela 3ª Turma do Tribunal Superior (REsp 1.381.606-DF), na qual se analisou a validade de cláusula de reajuste por faixa etária após o segurado atingir a terceira idade, isto é, a partir do momento que completa 60 (sessenta) anos.

Atualmente é contumaz verificar diversos consumidores ajuizando ações judiciais a fim de buscar a declaração de nulidade de cláusula contratual que prevê reajuste por faixa etária – na maioria das vezes exorbitantes – quando o próprio atinge a terceira idade.

De forma maçante os tribunais vêm reconhecendo a nulidade da mencionada cláusula em razão da força cogente do Estatuto do Idoso, o qual expressamente veda tratamento diferenciado a esse grupo em razão exclusivamente da idade.

Não obstante, na aludida decisão, a 4ª Turma posicionou-se no sentido de que o reajuste – mesmo após os 60 (sessenta) anos – é válido, desde que não seja desarrazoado ou aleatório.

A Turma fundamentou sua decisão, em breve síntese, no fato de que realmente com o passar da idade, o segurado naturalmente utiliza mais o plano de saúde, aumentando o seu risco subjetivo e consequentemente, o custo para a seguradora, o que justifica o referido reajuste.

Contudo, tal questão deverá ser analisada a luz do caso concreto, visto que, como bem salientou a Turma do STJ, deve-se encontrar um ponto de equilíbrio, a fim de chegar numa solução justa para ambos os interesses. Dessa forma, não está autorizada a seguradora a realizar reajustes que não justifiquem o nível do aumento aplicado.

Cabe, a partir dessa decisão, verificar qual posição os Tribunais irão adotar, pois em muitos casos, a cláusula de reajuste por faixa etária é declarada nula independente do percentual praticado pela seguradora.

Já o segundo caso, que foi analisado pela 4ª Turma do STJ (REsp 1.279.241-SP), tratou do cabimento de custeio de tratamentos experimentais pelas seguradoras de doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde (CID-OMS).

Em que pese haver previsão legal permitindo que as operadoras de planos de saúde possam excluir da cobertura qualquer tratamento clínico ou cirúrgico experimental, há igualmente dispositivo legal determinando que as seguradoras devem garantir coberturas mínimas para tratamento e serviços que busquem a cura ou o controle da doença do segurado.

Em razão desse aparente conflito de normas, a Turma posicionou-se no sentido de que, não sendo o tratamento convencional suficiente ou eficaz para a cura ou controle da doença do segurado e existindo tratamento experimental para tal condição dentro do país, esse deve ser englobado dentro do mínimo garantido pela lei e, consequentemente, deve ser fornecido pelas operadoras, sem qualquer acréscimo de ônus ao consumidor

Contudo, para que o mencionado tratamento seja custeado pela seguradora é necessário que esteja disponível em instituição de reputação científica reconhecida dentro do território nacional, bem como haja a “indicação médica para tanto, e os médicos que acompanhem o quadro clínico do paciente atestem a ineficácia ou a insuficiência dos tratamentos indicados convencionalmente para a cura ou controle eficaz da doença.”.

Nesse cenário, caberá às seguradoras o pagamento integral do tratamento experimental, não obstante cláusula contratual em sentido oposto.

Seguem transcritas ambas as ementas disponibilizadas no Informativo nº 551 do STJ:

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. REAJUSTE DE MENSALIDADE DE SEGURO-SAÚDE EM RAZÃO DE ALTERAÇÃO DE FAIXA ETÁRIA DO SEGURADO.

É válida a cláusula, prevista em contrato de seguro-saúde, que autoriza o aumento das mensalidades do seguro quando o usuário completar sessenta anos de idade, desde que haja respeito aos limites e requisitos estabelecidos na Lei 9.656/1998 e, ainda, que não se apliquem índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o segurado. Realmente, sabe-se que, quanto mais avançada a idade do segurado, independentemente de ser ele enquadrado ou não como idoso, maior será seu risco subjetivo, pois normalmente a pessoa de mais idade necessita de serviços de assistência médica com maior frequência do que a que se encontra em uma faixa etária menor. Trata-se de uma constatação natural, de um fato que se observa na vida e que pode ser cientificamente confirmado. Por isso mesmo, os contratos de seguro-saúde normalmente trazem cláusula prevendo reajuste em função do aumento da idade do segurado, tendo em vista que os valores cobrados a título de prêmio devem ser proporcionais ao grau de probabilidade de ocorrência do evento risco coberto. Maior o risco, maior o valor do prêmio. Atento a essa circunstância, o legislador editou a Lei 9.656/1998, preservando a possibilidade de reajuste da mensalidade de seguro-saúde em razão da mudança de faixa etária do segurado, estabelecendo, contudo, algumas restrições a esses reajustes (art. 15). Desse modo, percebe-se que ordenamento jurídico permitiu expressamente o reajuste das mensalidades em razão do ingresso do segurado em faixa etária mais avançada em que os riscos de saúde são abstratamente elevados, buscando, assim, manter o equilíbrio atuarial do sistema. Posteriormente, em razão do advento do art. 15, § 3º, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) que estabelece ser “vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”, impõe-se encontrar um ponto de equilíbrio na interpretação dos diplomas legais que regem a matéria, a fim de se chegar a uma solução justa para os interesses em conflito. Nesse passo, não é possível extrair-se do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso uma interpretação que repute, abstratamente, abusivo todo e qualquer reajuste que se baseie em mudança de faixa etária, mas tão somente o aumento discriminante, desarrazoado, que, em concreto, traduza verdadeiro fator de discriminação do idoso, por visar dificultar ou impedir a permanência dele no seguro-saúde; prática, aliás, que constitui verdadeiro abuso de direito e violação ao princípio da igualdade e divorcia-se da boa-fé contratual. Ressalte-se que o referido vício – aumento desarrazoado – caracteriza-se pela ausência de justificativa para o nível do aumento aplicado. Situação que se torna perceptível, sobretudo, pela demasiada majoração do valor da mensalidade do contrato de seguro de vida do idoso, quando comparada com os percentuais de reajustes anteriormente postos durante a vigência do pacto. Igualmente, na hipótese em que o segurador se aproveita do advento da idade do segurado para não só cobrir despesas ou riscos maiores, mas também para aumentar os lucros há, sim, reajuste abusivo e ofensa às disposições do CDC. Além disso, os custos pela maior utilização dos serviços de saúde pelos idosos não podem ser diluídos entre os participantes mais jovens do grupo segurado, uma vez que, com isso, os demais segurados iriam, naturalmente, reduzir as possibilidades de seu seguro-saúde ou rescindi-lo, ante o aumento da despesa imposta. Nessa linha intelectiva, não se pode desamparar uns, os mais jovens e suas famílias, para pretensamente evitar a sobrecarga de preço para os idosos. Destaque-se que não se está autorizando a oneração de uma pessoa pelo simples fato de ser idosa; mas, sim, por demandar mais do serviço ofertado. Nesse sentido, considerando-se que os aumentos dos seguros-saúde visam cobrir a maior demanda, não se pode falar em discriminação, que somente existiria na hipótese de o aumento decorrer, pura e simplesmente, do advento da idade. Portanto, excetuando-se as situações de abuso, a norma inserida na cláusula em análise – que autoriza o aumento das mensalidades do seguro em razão de o usuário completar sessenta anos de idade – não confronta o art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, que veda a discriminação negativa, no sentido do injusto. Precedente citado: REsp 866.840-SP, Quarta Turma, DJe 17/8/2011. REsp 1.381.606-DF, Rel. originária Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. João Otávio De Noronha, julgado em 7/10/2014.

DIREITO DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE DE SEGURADORA OU OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE CUSTEAR TRATAMENTO EXPERIMENTAL.

A seguradora ou operadora de plano de saúde deve custear tratamento experimental existente no País, em instituição de reputação científica reconhecida, de doença listada na CID-OMS, desde que haja indicação médica para tanto, e os médicos que acompanhem o quadro clínico do paciente atestem a ineficácia ou a insuficiência dos tratamentos indicados convencionalmente para a cura ou controle eficaz da doença. Cumpre esclarecer que o art. 12 da Lei 9.656/1998 estabelece as coberturas mínimas que devem ser garantidas aos segurados e beneficiários dos planos de saúde. Nesse sentido, as operadoras são obrigadas a cobrir os tratamentos e serviços necessários à busca da cura ou controle da doença apresentada pelo paciente e listada na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde (CID-OMS). Já o art. 10, I, da referida Lei estabelece que as seguradoras ou operadoras de plano de saúde podem excluir da cobertura o tratamento clínico ou cirúrgico experimental. Nessa linha intelectiva, a autorização legal para que um determinado tratamento seja excluído deve ser entendida em confronto com as coberturas mínimas que são garantidas. Tanto é assim que o art. 10 da Lei 9.656/1998 faz menção expressa ao art. 12 do mesmo diploma legal e vice-versa. Desse modo, o tratamento experimental, por força de sua recomendada utilidade, embora eventual, transmuda-se em tratamento mínimo a ser garantido ao paciente, escopo da Lei 9.656/1998, como se vê nos citados arts. 10 e 12. Isto é, nas situações em que os tratamentos convencionais não forem suficientes ou eficientes – fato atestado pelos médicos que acompanham o quadro clínico do paciente –, existindo no País tratamento experimental, em instituição de reputação científica reconhecida, com indicação para a doença, a seguradora ou operadora deve arcar com os custos do tratamento, na medida em que passa a ser o único de real interesse para o contratante. Assim, a restrição contida no art. 10, I, da Lei 9.656/1998 somente deve ter aplicação nas hipóteses em que os tratamentos convencionais mínimos garantidos pelo art. 12 da mesma Lei sejam de fato úteis e eficazes para o contratante segurado. Ou seja, não pode o paciente, à custa da seguradora ou operadora de plano de saúde, optar por tratamento experimental, por considerá-lo mais eficiente ou menos agressivo, pois lhe é disponibilizado tratamento útil, suficiente para atender o mínimo garantido pela Lei. REsp 1.279.241-SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 16/9/2014.