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A entrega de imóvel diferente do vendido na planta ultrapassa o simples descumprimento contratual, gerando abalo moral indenizável.
Jacques Malka Y Negri
5/4/2017

Diante de um cenário nacional carregado de instabilidade, muitas questões relacionadas à compra e venda de imóveis estão sendo levadas ao Judiciário.

Há situações em que os compradores simplesmente desistem do negócio e, por não concordarem com as cláusulas contratuais que regem o assunto, recorrem judicialmente almejando reembolso do que pagaram, em patamar maior do que contratualmente ajustado. Mas este não é o foco deste artigo.

Hoje trataremos da situação em que a Construtora vai além do prazo para a entrega da obra e em decorrência do atraso, o comprador vem a postular indenização por danos materiais e morais.

Por danos materiais, na hipótese, se entende o que deixou de auferir o comprador como renda, por exemplo, ao não receber a unidade dentro do prazo estipulado e tampouco dentro do prazo de prorrogação avençado. Este prejuízo é denominado de “lucros cessantes”.

Com efeito, “descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra, é cabível a condenação da vendedora por lucros cessantes, havendo a presunção de prejuízo do adquirente, ainda que não demonstrada a finalidade negocial da transação. ” Neste compasso “com a inexecução do contrato pelas recorrentes, é mais do que óbvio terem os recorridos sofrido lucros cessantes a título de alugueres que poderia ter o imóvel rendido acaso tivesse sido entregue na data contratada, pois esta seria a situação econômica em que se encontrariam se a prestação das recorrentes tivesse sido tempestivamente cumprida”. (STJ - RECURSO ESPECIAL Nº 1.634.751 - SP (2016/0250092-1).

Mas não param por aí os prejuízos. Eventualmente, surgem os danos morais, também conhecidos como danos extrapatrimoniais. No mesmo julgamento acima citado, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, entendeu que “dissabores, desconfortos e frustrações de expectativa fazem parte da vida moderna, em sociedades cada vez mais complexas e multifacetadas, com renovadas ansiedades e desejos, e por isso não se mostra viável aceitar que qualquer estímulo que afete negativamente a vida ordinária configure dano moral”.

Porém, no julgado que aqui estamos analisando, a inadimplência da construtora foi bem além. Atrasou a entrega da obra e entregou o bem de forma diferente daquela compromissada. E, por isso, o STJ entendeu como caracterizados, além, do dano material, também o dano moral. Senão, veja-se: “A título exemplificativo, na hipótese de atraso considerável, por culpa da incorporadora, é possível cogitar-se da ocorrência de abalo moral, tendo em vista a relevância do direito à moradia”. E mais, “Na presente hipótese, verifica-se que não se trata apenas de atraso na entrega do imóvel, mas sim de entrega em conformação distinta àquela adquirida, pois a unidade imobiliária entregue pelas recorrentes apresentou padrão diferente do adquirido - sem vista para o mar e sem uma suíte. ”

Ora, não há a menor dúvida de que a construtora usou e abusou do direito de infringir o contrato, certa de que sairia impune. Mas não foi isso que aconteceu. Corretamente, a Justiça reconheceu, no caso concreto, a presença de danos materiais e morais.

Concluindo, é muito importante enfatizar, que cláusulas contratuais, por si só, não são – e tampouco representam – garantia para o inadimplemento e atraso injustificado. De um lado, o consumidor deve cumprir com as suas obrigações e de outro, a construtora/incorporadora deve entregar a tempo – e exatamente na forma compromissada - aquilo a que se obrigou.