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14 de junho, 2019

Plano de Previdência Privada (VGBL) tem natureza jurídica de contrato de seguro de vida? Seus valores devem integrar a herança?

postado por Jacques Malka Y Negri

Enquanto muito se discute pelos quatro cantos do país sobre Reforma da Previdência, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, decidiu, no dia 10/06/2019, que VGBL para efeitos de herança, não se confunde com PGBL. Sobre o primeiro, decidiu a justiça, não incidir imposto de herança.

Muitos, até hoje desconhecem a real diferença entre estes dois produtos, claras opções de investimento. Não se pretende, nesta breve análise, o aprofundamento nas questões que, por razões financeiras ou tributárias, se deva optar por uma ou outra aplicação.

Nosso propósito, é chamar a atenção para um perigoso precedente, o qual já vinha sendo sufragado pelo STJ e agora, também pela decisão judicial a seguir comentada.

Com efeito, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça, ao julgar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – processo nº. 0008135-40.2016.8.19.0000 declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade do artigo 23 da Lei nº. 7.174/2015 no que diz respeito, exclusivamente, ao VGBL como fato gerador do imposto causa mortis (isto é, exigido em decorrência de herança).

Diz o referido dispositivo da lei 7.174/2015:

“Art. 23. Na transmissão causa mortis de valores e direitos relativos a planos de previdência complementar com cobertura por sobrevivência, estruturados sob o regime financeiro de capitalização, tais como Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) ou Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), para os beneficiários indicados pelo falecido ou pela legislação, a base de cálculo é:

I – o valor total das quotas dos fundos de investimento, vinculados ao plano de que o falecido era titular na data do fato gerador, se o óbito ocorrer antes do recebimento do benefício; ou

II – o valor total do saldo da provisão matemática de benefícios concedidos, na data do fato gerador, se o óbito ocorrer durante a fase de recebimento da renda. ”

Suprimido o VGBL como fato gerador da base de cálculo do imposto, remanesceu apenas o PGBL.

De forma singela, entenderam os julgadores, que “o denominado VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), no entanto, tem natureza diversa, sendo classificado como um seguro de pessoa, tanto que a Circular SUSEP nº. 339/2007, em seu artigo 2º, o inclui entre os planos de seguro de pessoas com cobertura por sobrevivência. Dessa forma, sendo o VGBL considerado um produto securitário, não é considerado herança, nos termos do que dispõe o artigo 794 do Código Civil”.

Realmente, o Código Civil exclui o seguro de vida da herança. Vale a leitura ao referido dispositivo:

Artigo 794 – Código Civil:

“No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito”.

É importante registrar que a SUSEP classifica ambos (VGBL e PGBL) como planos de sobrevivência. Ora, fosse para seguir o entendimento da SUSEP, igualmente o PGBL, quando há a indicação do(s) beneficiário(s), também estaria fora do patrimônio quando se trata de herança. Afinal, em conformidade com a SUSEP, o PGBL é classificado como plano de previdência complementar.

É curioso, porque quando realmente se trata de seguro de pessoa, o capital segurado não integra o patrimônio para efeito de herança. E nem poderia. O indivíduo contribui mensalmente com certa quantia e tem como importância segurada outra monta e esta, naturalmente, não integra o acervo de bens. Muito diferente é o caso de um VGBL ou PGBL, em que o volume de dinheiro amealhado, corresponde exatamente ao quantum aportado pelo investidor, acrescido dos rendimentos decorrentes da aplicação financeira daqueles recursos. É, portanto, situação completamente distinta de um seguro de pessoa.

Por isso, não se pode concluir tão facilmente, que o só fato de uma circular da SUSEP classificar um produto como “seguro de pessoa”, seja forte o suficiente para sua exclusão da herança.

A conclusão decorre de óbvia lógica: – a prevalecer tal entendimento, estar-se-á abrindo uma porta para possível fraude contra herdeiros obrigatórios.

Recentemente, o STJ enfrentou um caso concreto, no qual a mãe vendeu um imóvel e aplicou o produto na contratação de um VGBL, indicando a filha como beneficiária. Ao seu óbito, outro coerdeiro, trouxe o tema à baila, alegando prejuízo, afinal de contas, em tese, ostentavam iguais direitos.

A falecida, no caso acima, poderia perfeitamente dispor, de maneira expressa, de uma parte disponível de sua herança em favor da filha, mas não o fez e com isso, clara e induvidosamente, lesou o outro herdeiro. Lamentavelmente, o Tribunal de Justiça de São Paulo e o STJ acolheram a tese de que o VGBL, sendo um seguro de pessoa, não deveria integrar o acervo hereditário. Ao nosso sentir, erraram os julgadores e com isso, ratificaram que o prejuízo do herdeiro não seria sequer objeto de compensação. (AgInt nos EDcl no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 947.006 – SP  (2016/0171842-7)

É interessante observar, que se o contribuinte de seguro de pessoa cessar a contribuição mensal, na maioria dos casos, perderá todos os valores aportados. É algo que faz para garantir ao beneficiário uma segurança em caso de morte ou na ocorrência de algum outro sinistro previsto na apólice. Há 2 figuras com interesses antagônicos. O segurado, de um lado, aposta que seu beneficiário, em caso de morte, receberá mais do que o valor aportado. Não fosse assim, aplicava o segurado em nome próprio. O segurador, a seu turno, aposta que receberá do segurado mais do que pagará ao beneficiário. Ambos jogam com o tempo.

Já no caso do VGBL – assim como do PGBL – não é este o jogo. A totalidade do dinheiro que está sendo aplicado e, ao depois, pago, é do próprio contribuinte, que delegou a terceiro, o investimento de seus recursos.

Imagine-se, que, desejando o contribuinte furtar-se ao direito dos herdeiros obrigatórios, resolva direcionar todos os seus recursos até então depositados em uma Caderneta de Poupança, por exemplo, para um investimento em VGBL, nominando, como beneficiário, pessoa completamente estranha à herança. Neste caso, e vindo a óbito, se tratado o VGBL como “seguro de pessoa”, seus herdeiros não farão jus a nada.

Em outra situação, o contribuinte age de igual forma ao exemplo acima, porém, escolhe como investimento o PGBL. Pelo entendimento do acórdão aqui comentado, se tratará de herança.

Ora, qual a diferença entre uma e outra aplicação? O dinheiro aplicado no exemplo acima teve a mesma origem – Caderneta de Poupança – mas, o destino final de acordo com esta decisão judicial será diferente.

Ao nosso sentir, PGBL e VGBL, são indistintamente opções de investimento, também conhecidos como previdência privada, jamais seguro de pessoa insuscetível de herança.

Não por outra razão, o Estado do Rio de Janeiro, através da referida Lei 7.174/15, tratou expressamente do assunto, enquadrando os dois produtos no rol de bens e direitos sobre os quais haverá incidência do imposto causa mortis.

No início do ano de 2018, um sítio eletrônico veiculou interessante artigo, cujo tema era “Seguro de vida, previdência privada e investimentos: não confunda esses produtos”. Valem destaque as seguintes passagens:

Tanto o seguro de vida quanto a previdência privada olham para o longo prazo, contudo, as semelhanças param por aí. Cada um tem funções e benefícios específicos. Os produtos de previdência, PGBLs e VGBLs, têm como objetivo a aposentadoria, possibilitam a escolha entre os regimes tributários progressivo ou regressivo e a redução da base tributável em até 12% –quando o Imposto de Renda (IR) é declarado na modalidade completa e as contribuições são feitas no PGBL.

Além disso, utilizam fundos de investimento especialmente constituídos (FIEs), nos quais não incide o come-cotas, uma cobrança semestral de IR prevista na maioria dos fundos de investimento convencionais e que diminui a rentabilidade no longo prazo.

Já os seguros de vida individuais, mesmo os chamados resgatáveis, têm como objetivo proteger a condição financeira dos beneficiários no caso da falta precoce e inesperada do segurado, ou a condição financeira do próprio cliente, em situações que possam transformar sua vida, como uma invalidez acidental, doença grave e até internações hospitalares. Por isso, não são nem devem ser confundidos com investimento ou previdência. ”

(Fonte: https://www.infomoney.com.br/conteudo-patrocinado/seguro-de-vida/noticia/7198065/seguro-vida-previdencia-privada-investimentos-nao-confunda-esses-produtos).

Concluindo, embora possa ser admitida a prova do desvio fraudulento de aplicações financeiras para o VGBL, em detrimento de herdeiros, a presunção legal está mais forte e concentrada na licitude da contratação do VGBL para afastar o produto da herança e, por conseguinte, do alcance dos herdeiros necessários que não figurarem expressamente como beneficiários.

Com todo o respeito às mais abalizadas decisões e entendimentos, pelas razões aqui estudadas, discordamos da posição majoritária na direção de que Plano de Previdência Privada (VGBL), mantido por pessoa que venha a óbito, tenha natureza jurídica de contrato de seguro de vida.

1 Comentário

Flores da Cunha

Artigo muito interessante. Agradeço seu compartilhamento. Parabéns, Dr. Jacques.

14/06/2019 às 12:56h

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